terça-feira, 13 de setembro de 2011

PROVA DE VIDA

maputo

Não preciso de inventar uma linha, neste quotidiano pasmo. O desassossego, ou o assombro, assaltam-nos, apesar de nós, desabridamente.
Vou ao notário. Sento-me na esplanada contígua às sete e meia e peço um café. O empregado esclarece-me, só daqui a 20 minutos, o patrão hoje chegou mais tarde e só agora ligou a máquina. Espero. Espreito as minhas anotações num livro e escrevo num caderno: «o zapping é o novo deserto, a afasia como comunidade…».
Chegou a hora de ir tirar as fotocópias do documento que pretendo reconhecer. Nas imediações do notário existem sete papelarias com fotocópias. Abrem todas às oito. Às oito e vinte ainda nenhuma delas está aberta. Desisto, pego no carro e vou a uma loja de chineses 4 quarteirões depois. Regresso ao notário e verifico que uma das papelarias já abriu. Compro uma bic e, como conheço a dona, comento com ela, risonhamente, a abstenção de horário. Sorriso de lua cheia da senhora: pois!
No perímetro, só uma loja abriu à hora marcada. Não adivinham? A funerária. Esses sabem que não há tempo a perder.
Chego ao consulado português para renovar o passaporte e o computador que tem o programa biométrico engasga-se ao tirar-me a foto, faz puf e vem abaixo. Com paciência, o funcionário reinicia o processo, novo preenchimento de dados, cinco seis vezes. Perdemos quase uma hora nisto. Chego à caixa para pagar e a senhora inspecciona-me os euros e rejeita-me duas notas de cinco euros, porque estão amassadas. O banco não vai aceitá-las por estarem velhas, repisa. Velhas destas queria-las aos molhos, refuto, mas perco no braço de ferro, vá a uma loja de câmbios trocá-las, ordena. Nem discuto mais.
Atravesso a avenida e entro na primeira casa de câmbios, nada. Na segunda, escusam-se. Palmilho mais de 500 metros no encalço da terceira, contando os tostões para o caso de ter de comprar mais 10 euros. Apanho uma aluna na caixa da loja de câmbios, ai professor não gostei nada da minha nota, mas rogo & suplico e ela lá me faz o favor. Volto ao consulado por uma sulco da transpiração que me escorre espinha abaixo, 36 graus sem sombras, que podaram as árvores da avenida. Dirijo-me à caixa, fechada, a senhora saiu para tomar um cafezinho. Espero mais meia-hora, amaldiçoando a sorte. Chega, estendo-lhe as notas, impaciente. Pelo olhar dela ao manusear as notas percebo que me enganei nas cédulas a trocar. Vocifera baixo, mas cede, de trombil. Prova de vida. 

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